Um Desenho Universal para a Rede.

20/03/2006 - Revista A Rede.

MAQ em frente ao computador.

A legislação determina, as tecnologias permitem, mas a internet e a produção de informação mediada por computadores ainda não são projetadas para as pessoas com deficiência. Os formuladores de políticas, contudo, começam a acordar para o tema da acessibilidade nos programas dos telecentros públicos.

Depois dos 40 anos, muita gente se surpreenderá com dificuldade para enxergar os números do forno microondas ou do celular. Os óculos são dispositivos de acessibilidade. Felizmente, encontradiços e corriqueiros. Pois um total de 24,6 milhões de pessoas se declararam possuidoras de algum tipo de deficiência física ou mental que impõe limitações a atividades rotineiras, segundo o censo de 2000, feito pelo IBGE. Isso significa 14,5% de toda a população brasileira, que enfrenta tremenda escassez de dispositivos que permita o exercício pleno de seus direitos. A chegada da internet tirou muitos desses cidadãos da reclusão e abriu canais para a organização e a vida social. Navegar na web ou operar outras ferramentas de comunicação, contudo, ainda são um desafio, que pode ser superado, quando as necessidades especiais deixarem de ser especiais e o conceito de acessibilidade universal se tornar uma demanda de toda a sociedade.

Concretamente, espera-se que os programadores aprendam a construir páginas na internet considerando a lógica dos leitores de telas para pessoas com deficiência visual e cegos; ou a economia ideal de gestos no comando do computador, para os portadores de tetraplegias ou outras disfunções motoras. E que as redes de TV adotem o uso da audiodescrição nos televisores para descrições sonoras das cenas para pessoas com deficiência visual e da legenda oculta para pessoas com deficiência auditiva, entre outras medidas que ainda não são levadas em conta. Além disso, as tecnologias assistivas, em geral caras e de códigos fechados, precisam se tornar elas próprias acessíveis - gratuitas e interoperáveis.

O que deve ser feito já está previsto no Decreto Federal 5296/2004, conhecido como Decreto de Acessibilidade, e em muitas outras normas. Mas a lei não é cumprida.

Apenas recentemente, a abordagem da acessibilidade começa a fazer parte das políticas públicas de inclusão digital. Está em curso uma iniciativa do programa Cultura Viva (do Ministério da Cultura), e do governo eletrônico (do Ministério do Planejamento) para incluir a questão na capacitação dos educadores e dos Pontos de Cultura, como já o fez a prefeitura de São Paulo com os supervisores dos telecentros da cidade. E os responsáveis pelos espaços multiuso Casa Brasil se reuniram com representantes do Ministério da Educação (MEC) para discutir como incrementar a oferta de tecnologias assistivas para plataforma Linux. O ideal, de acordo com Marcos Kinsky, gerente do projeto de acessibilidade digital do Serpro, é que as diretrizes e normas de acessibilidade fossem incluídas nos currículos do MEC, para as escolas do ensino fundamental e médio, e entre as disciplinas dos cursos superiores, uma ação massiva de educação para a acessibilidade.

Embora existam, atualmente, recursos de hardware e software que permitem, por exemplo, a existência de um site como o Dedos dos Pés, construído e escrito por Ronaldo Correia Júnior, pessoa com paralisia cerebral (que, ao contrário do que muitos pensam, compromete as funções motoras, mas não sua inteligência), as soluções para pessoas com deficiência, em geral, são caras e de compatibilidade restrita. O mundo da acessibilidade é proprietário, com códigos-fonte fechados. O Jaws, festejado leitor de telas para pessoas com deficiência visual, é vendido por cerca de US$ 1 mil, nos EUA, e por R$ 4,3 mil no Brasil, pela OnG LaraMara.

Sites poluídos.

Os leitores de tela lêem da esquerda para a direita, de cima para baixo - como fazem, normalmente, as pessoas que enxergam. A leitura de quem enxerga, contudo, é seletiva e acelerada, possibilitando atravessar rapidamente o enorme lixo de links redundantes ou informações desimportantes das páginas. O problema é que a esmagadora maioria dos sites da internet ignora os leitores de tela das pessoas com deficiência visual. E esse lixo fica lá, para ser lido, obrigatoriamente, em páginas que obedecem apenas à lógica de quem vê. "É a lógica do shopping center, do site comercial, que está cheio de pop ups, milhares de logotipos, menus repetitivos", diz Marcos Kinsky, do Serpro. "O leitor de tela vai ler tudo isso, o que se traduz numa demora infinita para o cego chegar ao conteúdo de seu interesse.

São muitas as normas de acessibilidade para a internet, baseadas nas diretrizes do www Consortium (W3C), entidade internacional que cuida das padronizações na internet, capazes de eliminar dificuldades como essa. Simplificar a vida para os leitores de tela também desobstrui a navegação para quem precisa fazer mais esforço para comandar o computador, devido a restrições motoras. As cartilhas de acessibilidade estão disponíveis na internet - uma das mais conhecidas foi escrita por Fábio Gameleira, da Dataprev, mas há documentação também no site do Serpro, da Rede Saci, da Prodam, de São Paulo, entre outros (veja os links).

De acordo com o consultor e ex-programador do Serpro, Marco Antonio de Queiroz, quando o assunto é informática e internet, acessibilidade significa, quase sempre, assegurar a navegação pelo teclado. Essa medida atende aos leitores de tela e também aos portadores de paralisias motoras, que digitam com auxílio de extensores ou adaptadores. "Garantir a convivência da navegação via mouse com a opção do teclado, oferecendo a dupla navegação, atenderia a 90% das demandas das pessoas com deficiência", diz Queiroz, que é cego e construiu o site Bengala Legal. A página tem o objetivo de educar a sociedade nas questões relativas às deficiências, e é voltada para pessoas com e sem deficiência, com o intúito de poder oferecer um acesso universal

"A maioria dos web designers acredita que acessibilidade é fazer a página fácil e rápida de ser carregada. E, mesmo quando adotam algumas das regras do WCAG - Web Contents Acessibility GuideLines (guia de conteúdos acessíveis para a web, do W3C), fazem uma transposição literal, o que compromete a usabilidade dos sites. Até poderiam ser considerados tecnicamente acessíveis, se fosse suportável navegar por eles", adverte Marco Antonio (também conhecido como MAQ). O consultor dá cursos para desenvolvedores de sites. No terceiro dia de aula, tira dos alunos o uso do mouse; no quarto, desliga o monitor. A estratégia é infalível para demonstrar a importância de uma outra lógica de organização dos conteúdos. "O resultado é uma percepção aumentada da navegação sonora, completamente diferente da visual, e que requer atalhos próprios para alcançar as informações", diz.

Um embaraço comum acontece no tratamento das imagens - identificadas com o atributo ALT, dentro do código. Quando a informação não for relevante, for apenas decorativa, esse atributo deve ficar vazio, para que o leitor de telas não o leia todas as exaustivas vezes em que ele aparecer. Se, ao contrário, houver um gráfico ou uma imagem significativa, ela deve contar com um descritivo consistente. O que acontece, muitas vezes, é que os arquivos das imagens são identificados por números " banner12345 ou semelhante , e não dizem nada aos usuários cegos. A acessibilidade para essas pessoas é deixar aquela imagem inteligível através de texto, que fica escondido de quem enxerga, mas audível através dos leitores de tela, que lêem o que está por detrás da imagem. Outro ponto importante é o da usabilidade da página. Para as pessoas que enxergam, rolar a tela é coisa comum e fácil, para pessoas com deficiência que navegam por via do teclado, ter saltos para a mesma página facilita o uso delas para que tais pessoas cheguem com mais facilidade aos assutos posicionados no meio ou ao final da página. "É a idéia da usabilidade, que precisa andar junto da acessibilidade", insiste Marco Antonio.

Por uma TV ampla, geral e irrestrita.

Há quem diga que o aparelho mais universal do Brasil é a televisão. Não é a opinião de quem não enxerga ou não ouve, e luta para que as redes de televisão incorporem close captions (legenda oculta) e janela com LIBRAS (aquela telinha que reproduz os sons em linguagem de sinais, para pessoas com deficiência auditiva) ou audiodescrição (descrição por voz de cenas mudas ou com música de fundo, para pessoas com deficiência visual) nas programações. Outra frente é a chegada da TV digital, que traz com ela a capacidade de oferecer novos modelos interativos de programação, de alcance mais democrático. O relatório final do CPqD sobre a TV digital no Brasil contempla o uso da tecnologia para transmissão de conteúdos com acessibilidade universal, além de projetos específicos para pessoas com deficiência.

Tecla SAP.

Além disso, e de implementação mais simples, Almir destaca o uso das teclas SAP ou de outras teclas para acionar as close captions ou as áudiodescrições. Segundo o consultor Marco Antonio de Queiroz, em vários países, desde 1995, a tecla SAP dos televisores é utilizada para audiodescrições das cenas, recurso regulamentado pela FCC - Federal Communications Commission, em 2002. No Brasil, a ABNT elaborou um projeto de norma de acessibilidade na televisão, que prevê o SAP para a audiodescrição, destinada a pessoass cegas, e o close caption para pessoas surdas, que esteve disponível para consulta pública até dia 28 de junho de 2005. E isso não depende da TV digital.

O Decreto Federal 5296/2004, no seu artigo 52, estabeleceu a obrigatoriedade das televisões brasileiras implantarem a audiodescrição e outros recursos para assegurar o acesso à informação aos portadores de deficiência auditiva ou visual - ou seja, "circuito de decodificação de legenda oculta"; recurso para Programa Secundário de Áudio (SAP); e entradas para fones de ouvido com ou sem fio. No artigo 53, estabelece que a Anatel teria 12 meses para regulamentar os procedimentos a serem observados para implementação do plano de medidas técnicas previstas no art. 19 da Lei no 10.098, de 2000, atendendo ao disposto no art. 31 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Isto é, deverá prever a utilização, entre outros, dos seguintes sistemas de reprodução das mensagens: a subtitulação por meio de legenda oculta; a janela com intérprete de Libras; e a descrição e narração em voz de cenas e imagens.

Prazo vencido.

Kinsky, do Serpro, avalia que todos os dias surgem novas páginas que ignoram as regras de acessibilidade. O Decreto Lei 5.296, de 2004, regulamentou as Leis nº 10.048/00, que dá prioridade ao atendimento a pessoas com necessidades especiais, e nº10.098/00, que estabelece normas gerais e critérios para a promoção da acessibilidade. Também fixou prazo até dezembro de 2005, prorrogável até o final deste ano, para que os sites públicos e de governo aderissem aos padrões de navegação acessível - por exemplo, dar a opção de ampliar os caracteres, alterar as cores e trabalhar de forma monocromática, e aceitar sintetizadores de voz dos leitores de tela. "Isso não está acontecendo", lamenta Kinsky.

São inacessíveis a milhões de brasileiros os endereços eletrônicos de governo, de serviços públicos - empresas de telecomunicações, provedores de acesso, instituições de ensino, etc.

"Talvez a solução não seja pancada, proibir e punir, até porque a lei fala em sanções, mas não as especifica. O melhor talvez seja educar, incluir acessibilidade nos currículos do MEC e das universidades, implementar uma ação educativa massiva", propõe Kinsky.

Livros falados.

Consórcio DAISY.

Daisy é um acrônimo de Digital Acessible Information System e se refere a padrões técnicos, baseados naqueles usados na internet, para produção de documentos multimídia acessíveis e adequados à navegação na web. Na prática, são livros falados (DTB, ou Digital Talking Books) em arquivos digitais, ou obras que trazem combinações sincronizadas de áudio e texto. Não se trata apenas da leitura gravada do texto, mas de uma estrutura diferente de organizar o conteúdo.

As pessoas com deficiência visual podem navegar pelas obras seguindo a ordem das páginas, ou por seções e capítulos, ou consultando uma tabela índice. O programa também pode soletrar as letras ou reproduzir o som ao mesmo tempo em que apresenta o texto em caracteres ampliados, para portadores de visão subnormal. Integram o Consórcio Daisy entidades de países como o Reino Unido, os Estados Unidos, Japão, Canadá, Suíça, Suécia, Holanda, Dinamarca, Coréia do Sul, Austrália, Alemanha e Espanha, empenhados na defesa da acessibilidade universal.

Fora do armário.

No mundo inteiro, onde as pessoas com deficiência são estimadas em 10% da população, a chegada da internet foi um divisor de águas na sua qualidade de vida. Basicamente, porque colocou as pessoas em contato, trocando idéias e apontando outras perspectivas, abrindo canais para a participação social e a defesa de seus direitos. "Era uma emoção tremenda encontrar cegos de outros lugares, gente que estava fazendo coisas importantes. As pessoas começaram a ter incentivos, a equalizar as informações", conta Marco Antonio, que situa esses primeiros encontros virtuais, realizados na lista de usuários do DosVox, no idos de 95 - ano em que a web deixou de ser exclusiva das universidades.

O espaço de convívio pode representar, em muitos casos e sem exagero, a diferença entre querer viver e afundar em depressão, consequência do isolamento agudo imposto a muitos. Cláudia Aparecida de Lira, de 23 anos, fez até o meio da 6ª série em uma escola pública de São Paulo. "Saí de lá, porque os amigos não me ajudavam, não emprestavam caderno, só queriam empurrar minha cadeira de rodas; fiquei até doente e só chorava, dia e noite", lembra. Cerca de dois anos depois, em 2005, "sempre triste", Cláudia foi encaminhada pela Associação de Apoio à Criança Deficiente (AACD) ao Instituto Efort, em São Paulo, onde funciona o telecentro de acessibilidade total da prefeitura. Atualmente, ela vem de Americanópolis, perto de Diadema, na Grande São Paulo, à capital, duas vezes por semana, para frequentar aulas no instituto - informática, contação de histórias, e reforço escolar. "Estou feliz; aqui tem cego, surdo, gente da comunidade, todo mundo igual, se ajudando", descreve.

Um dos parceiros de Cláudia, a dois micros de distância no telecentro, é Donizetti Fernandes Batista, de 43 anos. Em 1998, ele trabalhava na JVC, companhia de energia do Ceará, quando recebeu uma descarga elétrica e, devido à queimadura, perdeu os dois braços. Aposentado, vai ao Efort três vezes por semana participar de um programa de recapacitação profissional, desenvolvido em parceria com o INSS. Prepara-se para voltar ao mercado de trabalho.

Maria Regina Maciel, presidente do instituto, acredita que há muito a fazer nos telecentros, em termos de acessibilidade. "Até em questões muito simples, como as relativas "LER-Lesão por Esforço Repetitivo" (problema nas articulações causado pelo exercício da digitação). Quem, nos telecentros, está atento à forma de digitar dos usuários?", pergunta ela. "E muitos portadores de deficiências não precisariam de nenhum equipamento especial para serem atendidos. Apenas que os monitores e voluntários não tivessem medo deles", diz.

Caixa eletrônico sem barreiras.

O mundo virtual construiu muitas barreiras para as pessoas com deficiência, mas não tantas quantas as que existem no mundo não-virtual. Não é possível pôr as cidades abaixo, mas os novos prédios precisam seguir a norma NBR 9050, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que dispõe sobre as condições de acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Por exemplo, os caixas eletrônicos dos bancos devem oferecer opções de altura adequada aos usuários de cadeiras de rodas. Norma regulamentada em dezembro de 2004 pelo Banco Central.

As normas derivam do Decreto presidencial 5296/2004, que, no parágrafo 3, do artigo 16, determina que "botoeiras e demais sistemas de acionamento dos terminais de auto-atendimento de produtos e serviços e outros equipamentos em que haja interação com o público devem estar localizados em altura que possibilite o manuseio por pessoas em cadeira de rodas, e possuir mecanismos para utilização autônoma por pessoas portadoras de deficiência visual e auditiva, conforme padrões estabelecidos nas normas técnicas de acessibilidade da ABNT". Paulo Romeu Filho, analista de sistemas da Prodam e militante da acessibilidade nos meios de comunicação foi um dos participantes da criação da norma. Além disso, o decreto 5296 dá prazo de dois anos (até dezembro de 2006) para que os bancos o cumpram.

Ação nos telecentros.

Com essa preocupação, a prefeitura de São Paulo, no final do ano passado, capacitou os supervisores de todos os telecentros municipais, com ajuda do Instituto Efort. Segundo Élcio Luiz Figueiredo, coordenador do projeto Telecentros da Secretaria de Participação e Parceria, serão abertas mais três unidades no modelo do acesso universal, ainda neste semestre. O Efort vai apoiar a expansão da rede, que terá a participação da USP e da IBM, para equipar os telecentros com equipamentos de ponta, como o leitor de tela Jaws, ampliadores de letra, extensores para que as pessoas sem braços possam teclar ou que o façam por meio de movimentos da cabeça; teclados especiais; tábuas de letras.

Esse conjunto de ferramentas, a maior parte importada, já pode ser visto na unidade que fica na sede do instituto Efort, que também desenvolve atividades como capoeira, artes, artesanato, apoio educacional. E Élcio Figueiredo espera levar, tanto quanto possível, os sistemas assistivos para os demais telecentros da cidade. "Desde que superadas dificuldades técnicas, porque os telecentros usam Linux", observa.

Perceber o mundo.

Outros atuantes nas questões de acessibilidade são a Rede Saci e o grupo de terapia ocupacional da Divisão Medicina de Reabilitação, do Hospital das Clínicas, ambos ligados à USP. No HC, estão sendo testados softwares e outras ferramentas para pessoas com deficiências físicas. O site da Rede Saci é referência obrigatória em acessibilidade, com mais de 18 mil páginas que abrangem os temas educação e trabalho. "Duas áreas fundamentais para que a pessoa seja incluída e reconhecida na sociedade", justifica Marta Gil, coordenadora da Saci.

Os conteúdos, todos copyleft, estão distribuídos por áreas: acessibilidade do meio físico e digital; deficiências; trabalho; educação. Há, ainda, um guia para telecentros, listas de discussão (onde namoram muitos adolescentes e que já provocou pelo menos um casamento), software para download (o DosVox), documentos, artigos e notícias. São mais de 10 mil usuários cadastrados no Brasil, e 300 de outros países. Nas listas da Saci, as pessoas se mobilizam e geram demandas políticas. Nos últimos meses, organizaram um movimento para incluir o livro acessível na pauta dos organizadores da Bienal do Livro, que se realiza este mês em São Paulo.

"A partir do site, as comunidades vão se empoderando, termo que é esquisito, mas que significa isso mesmo: ganhando poder para defender seus direitos", diz Marta. Direito de pesquisar na internet, de produzir e receber informação, de se comunicar, de perceber e entender as coisas que estão no mundo. Uma emoção do tamanho da que sentiu o menino Miguilim ao colocar pela primeira vez os óculos - e, junto com ele, todos os leitores do conto "Manuelão e Miguilim", do escritor mineiro João Guimarães Rosa.

Dedos dos Pés.

Ronaldo Correia Júnior, autor do site "Dedos dos Pés", escreve em seu site: "Como você pode ver, uso o computador de uma maneira diferente, com os dedos dos pés. A razão disso é que, devido a um acidente de parto em que me faltou oxigênio, fiquei com uma paralisia cerebral. Apesar disso, minhas funções mentais não foram prejudicadas e sou mental e psicologicamente normal - a Internet é o único espaço em que esse fato é evidente: em geral, as pessoas têm uma imensa dificuldade em acreditar que não tenho retardo mental, problemas de percepção ou pelo menos uma ingenuidade elefantina".

Ronaldo. "De fato, como não posso falar - como também não me é possível andar, comer, me vestir etc, sem ajuda a comunicação comigo é bastante complicada e, por isso, era bem problemático expressar o que me passava pela cabeça. Na melhor das hipóteses, alguém tinha de dizer o alfabeto inteiro para que formasse as palavras, letra por letra, o que inviabilizava qualquer tipo de conversação, o que pode facilmente ser interpretado como sinal de retardo mental, já que é raro alguém com paralisia cerebral não ter esse problema. Sem falar do preconceito, que é mais forte em países como o Brasil. Superar essa dificuldade de comunicação foi um longo processo, que incluiu desde a compra de uma máquina de escrever elétrica - que hoje me parece algo da idade da pedra - até o ingresso na Internet, cuja etapa mais importante foi a confecção de uma tábua com letras e números, coisa simples mas que me permitiu conversar em tempo real - uso todos esses meios do mesmo modo, com os dedos dos pés".

"Só tive oportunidade de estudar até a sexta série, mas meu nível cultural não deixa nada a dever ao de um universitário. De fato, para fugir do tédio virei um leitor voraz e acabei me tornando autodidata em Economia. Também gosto de história, filosofia, ciência - particularmente física, astronomia e matemática, tecnologia e ficção cientifica".

Dicas para programadores.

  • Imagens e animações Use o atributo alt para descrever a função de cada elemento visual.
  • Imagemaps Use mapas client-side (o tag map) e texto para as regiões clicáveis.
  • Multimídia Inclua legendas e transcrições para o áudio, e descrições para o vídeo.
  • Hiperlinks Utilize texto que faça sentido fora do contexto. Evite a frase "clique aqui".
  • Organização da página Use cabeçalhos, listas e uma estrutura consistente. Use CSS para layout e estilo, sempre que possível.
  • Gráficos e diagramas Sumarize o conteúdo ou use o atributo longdesc.
  • Scripts, applets e plug-ins Para o caso de estarem desabilitados ou de não serem suportados pelo browser, forneça conteúdo alternativo.
  • Frames Use o tag noframes e empregue títulos significativos.
  • Tabelas Torne compreensível a leitura linha a linha. Resuma.
  • Valide seu trabalho Use as ferramentas, checklist e os guias disponíveis em WCAG. Site Externo.

Links interessantes.

  • www.saci.org.br Site Externo. - Rede Saci. Referência obrigatória para assuntos de acessibilidade e sobre deficiências.
  • www.serpro.gov.br Site Externo. - Escolha a opção acessibilidade. Informações para desenvolvedores, e sobre o Letra.
  • www.bengalalegal.com - escolha a opção "Acessibilidade, Usabilidade", site de Marco Antonio de Queiroz, consultor cego, específica sobre acessibilidade.
  • www.lupadigital.info Site Externo. - Cartilha de acessibilidade para construção de sites, de Fábio Gameleira. a primeira cartilha no gênero do Brasil.
  • www.dedosdospes.com.br Site Externo. - Dedos dos Pés, site construído por Ronaldo Correia Júnior, pessoa com paralisia cerebral. Desfaz muitos mitos e preconceitos correntes.
  • www.lerparaver.com Site Externo. - Site de Portugal, feito por cegos, de acordo com padrões de acessibilidade e com muitas informações sobre deficiência visual.
  • www.dasilva.org.br Site Externo. - Avaliador de acessibilidade, usado pela OnG Acesso Brasil.
  • www.daisy.org Site Externo. - Consórcio internacional Daisy, que desenvolve padrões para a criação de leitores e livros falados.

Jornalista Verônica Couto, Revista A Rede - Março/2006.