Velejar pelo Sensorial ou pelo Visual?
Domingo passado tive uma experiência muito gratificante no Cantão de Indaiá, Bertioga, em um veleiro O'Day 12. Fui convidado para ensinar um casal de cegos a velejar. Todos sabem que para velejar é fundamental visualizar de onde vem o vento, o combustível do veleiro. E então fazemos o barco velejar contra o vento, de lado, a favor. Evidente que não diretamente de onde o vento vem (a chamada zona proibida). Esta região é utilizada para parar o barco, para fazer manobras de atracagem e outras.
Tenho realizado trabalhos com paraplégicos, amputados, pessoas com medo de água, mas todos enxergantes. Deste modo, a didática é baseada na orientação visual. Por isso, antes da parte prática, envio uma apostila por e-mail, com a parte teórica, e explico mais antes de ir para a água. Isto vale para atletas, idosos, jovens, crianças, pessoas com deficientes e todos os enxergantes. Mas neste caso não houve a parte teórica normal, apenas um breve repasse dos conceitos, acompanhado de apalpações no barco, no leme, nos controles, antes de entrar no mar.
Enfim, o ensino foi baseado mais nos outros sensoriais: tato, audição, olfato e talvez mais algum sentido. O resultado foi muito legal. Depois de 75 minutos eles estavam velejando e manobrando em todas as direções. Deram bordos, jibes, fizeram percursos curtos, longos, manobras rápidas, subiram ondas, desceram ondas. Depois de algum tempo só precisaram do enxergante a bordo para orientá-los sobre obstáculos, situações de água, outras embarcações e possíveis riscos. O resultado foi surpreendente, melhor que o conseguido com a média dos enxergantes, que muitas vezes depois de algumas manobras já não lembram a orientação no vento.
O casal de cegos, como todos os enxergantes, não viam o vento; mas o sentiam melhor que estes, e com a sua sensibilidade tátil apurada percebiam muito bem as reações do barco e tomavam procedimentos de acordo. Aprenderam rapidamente a sentir o barco, o que muitos somente descobrem depois de muitas e muitas velejadas.
O casal entendeu celeremente a resposta do vento, tal qual o famoso refrão de Bob Dylan:
"The answer, my friend, is blowing in the wind.
The answer is blowing in the wind."
Bons Ventos!
Augusto Coelho - Instrutor de Vela Náutica.
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