Artigo 19 - Vida Independente e Inclusão na Comunidade.

11/10/2008 - Romeu Kazumi Sassaki.*

A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, em seu artigo 19, destaca os seguintes conceitos, reconhecidos e a serem implementados pelos Estados Partes da Organização das Nações Unidas:

  • Igual direito.
    • Como os demais seres humanos, a pessoa com deficiência também tem o direito de viver na comunidade e de fazer escolhas. Este direito é o mesmo para todas as pessoas indistintamente.
  • Viver na comunidade.
    • Combatendo práticas sociais antigas que mantinham pessoas com deficiência em instituições pelo resto de suas vidas, surgiu lentamente, ao longo dos últimos 30 anos, um movimento mundial liderado por pessoas com deficiência e apoiado por familiares, profissionais e outros interessados, no sentido da implementação da filosofia de vida independente. O direito de viver na comunidade foi reconhecido em inúmeros documentos internacionais, pressionando governos e sociedades civis a fechar instituições terminais e a prover, pessoas com deficiência até então internadas e respectivos familiares, com os meios necessários para que elas pudessem viver com dignidade na comunidade aberta. O movimento brasileiro de vida independente começou a organizar-se no final da década de 1980 e hoje é uma realidade irreversível, consolidada e influente tanto no nível federal como em um crescente número de Estados e Municípios.
  • Fazer escolhas.
    • A prática de viver na comunidade foi construída com valores revolucionários, tais como: empoderamento, convivência na diversidade humana e respeito às diferenças individuais. O empoderamento consiste no uso do poder pessoal para - com independência - fazer escolhas, tomar decisões e assumir o controle da situação. Diferentemente de como acontecia no passado, hoje os profissionais, familiares, governos, instituições etc., por melhores que sejam suas intenções, não mais poderão impor escolhas, decisões e controles às pessoas com deficiência. De sua parte, a convivência na diversidade humana e o respeito às diferenças individuais são valores sociais aceitos mais facilmente que a autonomia.
  • Desfrute do direito à inclusão e participação na comunidade.
    • Os Estados Partes se obrigam a tomar medidas que facilitem às pessoas com deficiência o pleno desfrute do direito de viver na comunidade e de fazer escolhas, bem como a sua inclusão e participação na comunidade. Tal inclusão significa que a sociedade precisa adequar-se às características individuais de cada pessoa com deficiência (e não às características gerais deste segmento populacional enquanto grupo equivocadamente tomado como homogêneo). A referida participação significa que toda pessoa com deficiência tem a capacidade e o direito de tomar parte ativa na vida da comunidade, cada qual à sua maneira (e não passivamente e da forma esperada unilateralmente pela sociedade, como antigamente).
  • Escolha do local de residência e com quem morar.
    • Ao serem libertadas de antigas instituições terminais ou não serem encaminhadas agora a tais lugares, as pessoas com deficiência não devem ser obrigadas a morar em residências escolhidas por outrem, mesmo que estas se localizem no seio da comunidade. Hoje, as pessoas com deficiência têm o direito de escolher, com independência, o local de residência e com quem morar - uma importante ação de empoderamento e do estilo de vida independente e um exemplo de medida obrigatória dos Estados Partes.
  • Acesso a serviços de apoio.
    • Os Estados Partes também se obrigam a garantir às pessoas com deficiência o acesso a uma variedade de serviços de apoio em domicílio ou em instituições residenciais ou a outros serviços comunitários de apoio. Esta medida inclui os serviços que forem necessários como apoio para que pessoas com deficiência possam viver, com autonomia, na comunidade. A autonomia consiste no domínio da funcionalidade no ambiente. Executar atividades da vida diária, ir e vir nos espaços internos e externos, utilizar transportes, manusear equipamentos, ferramentas e dispositivos de tecnologia assistiva - são exemplos de autonomia física. Observe-se que a independência, diferentemente da autonomia, consiste na faculdade de tomar decisões sem depender de outras pessoas.
  • Serviços de atendentes pessoais.
    • Pessoas com deficiência, em muitos casos, necessitam contar com os serviços profissionais de atendentes pessoais quando a autonomia física no controle de seu corpo e/ou de seus membros estiver significativamente comprometida. Estes serviços podem significar a diferença entre viverem isoladas em casa ou serem incluídas na vida da comunidade.
  • Sistemas sociais inclusivos.
    • Uma outra medida assumida pelos Estados Partes consiste em garantir que todos os serviços e instalações da comunidade, que estejam ou vierem a estar disponíveis para a população em geral, sejam tornados adequados às pessoas com deficiência atendendo às suas necessidades. Não se trata de "adaptar" os sistemas comuns para as pessoas com deficiência. Pois quando adaptamos os sistemas comuns, continuamos mantendo-os como corretos, normais, referenciais, enquanto reforçamos - inadvertidamente - a idéia de que os sistemas adaptados são arremedos, quebra-galhos, produtos de segunda categoria. Trata-se, sim, de "adequar" os sistemas comuns às diversidades humanas e diferenças de todas as pessoas. Pois quando adequamos os sistemas comuns que ainda não estiverem acessíveis, estamos atendendo aos requisitos dos conceitos de "equiparação de oportunidades" e de "desenho universal" e tornando inclusivas todas as estruturas da sociedade no mesmo nível de importância.

* A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência Comentada / Coordenação de Ana Paula Crosara Resende e Flavia Maria de Paiva Vital - Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, 2008.
Romeu Kazumi Sassaki, Artigo 19 - Vida Independente e Inclusão na Comunidade, Pág.: 71.
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